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II - A Europa no tempo da Revolução Francesa

Durante a Revolução Francesa, a França esteve em guerra com as principais potências europeias em vários teatros de operações mas também fora da Europa. O objectivo deste capítulo é mostrar de forma muito resumida o que existia no espaço geográfico que serviu de palco a esses acontecimentos.

A população europeia era, em 1800, cerca de 187 milhões de habitantes, ou seja, cerca de 20,9% da população mundial (889 milhões). Este número significa um crescimento relativamente às últimas décadas e continuará a aumentar a um ritmo ainda maior: entre 1750 e 1800 cresceu 34% e entre 1800 e 1850 cresceu 43%. Isto significa que quase duplicou em cem anos. Este crescimento explica-se pela melhoria das condições materiais da população e a descida do índice de mortalidade, em especial nos países que mais rapidamente avançaram para a industrialização. Em 1798, o britânico Edward Jenner descobriu a vacina contra a varíola, acontecimento que fez diminuir a mortalidade infantil. No espaço de tempo acima considerado (1750-1850), o índice europeu de mortalidade baixou em cerca de 10%. Isto não significou o desaparecimento das epidemias que, periodicamente devastavam a Europa. O tifo e a cólera faziam-se sentir especialmente após os anos de más colheitas e durante as guerras. Em 1800, a população europeia distribuía-se da seguinte forma: 

País

População

País

População

Espanha

11.500.000

Itália

18.100.000

Portugal

2.900.000

Rússia Europeia

36.000.000

França

28.200.000

Holanda

2.100.000

Grã-Bretanha

10.900.000

Bélgica

3.000.000

Irlanda

5.200.000

Suíça

1.700.000

Prússia

6.200.000

Dinamarca

900.000

Império Austríaco

23.500.000

Noruega

800.000

Suécia

2.300.000

Na generalidade das monarquias europeias do Antigo Regime, a sociedade estava dividida em ordens, de acordo com conceitos que se mantinham desde a época medieval: o clero, a nobreza e o povo. A divisão da sociedade em ordens, que veremos mais pormenorizadamente no caso francês (Capítulo III), não impedia a existência de um leque variado de recursos à disposição de cada indivíduo. Existia uma diferença muito grande entre o bispo e o pároco de uma qualquer aldeia, o nobre da corte e grande proprietário e o nobre da província que obtinha parcos recursos de uma propriedade muito mais pequena e onde eram técnicas ineficazes de agricultura, entre o comerciante que teve a capacidade de investir no comércio com as colónias e o artesão humilde que produzia alguns produtos encomendados pelo mercador e, simultaneamente trabalhava uma pequena parcela de terra. Na área da produção não agrícola, a Grã-Bretanha era sem dúvida o país mais evoluído, a origem da Revolução Industrial.A Europa de 1789 era um espaço predominantemente rural. Nas zonas de mais forte tradição urbana, mais de 72% da população era rural. O normal era esse valor ultrapassar os 90%. Só existiam duas grandes cidades: Londres, com cerca de 1.000.000 de habitantes, e Paris com perto de 500.000. Na generalidade dos países era raro encontrar mais que uma cidade com 100.000 habitantes ou mais. A maioria da população urbana vivia em cidades com menos de 20.000 habitantes e a sua prosperidade provinha do campo. Isto significava que as questões agrárias, as boas ou más colheitas com as consequentes descidas ou subidas dos preços, com anos de relativo bem-estar ou de fome, eram as questões fundamentais da época, não só pelas questões económicas mas também porque o estatuto nobre, mesmo o de pequena nobreza, não se concebia sem a posse de uma propriedade.

Esta revolução teve o seu início na década de 80 do século XVIII. Foi nesta altura que «todos os índices estatísticos relevantes descreveram a súbita curva ascendente que assinala o arranque.» [Hobsbawm, 1962, p. 37] Em toda a Europa, os governantes preocupavam-se com o crescimento económico e surgiam focos de industrialização. No entanto, a Grã-Bretanha encontrava-se já num lugar de destaque tanto na produção como no comércio. Apesar disso, as vantagens científicas e técnicas pertenciam à França onde se produziam mais inventos e melhores navios. As vantagens do ensino pertenciam aos principais Estados alemães onde existiam as melhores instituições de ensino técnico, tal como a École Polytechnique que os Franceses lançaria mais tarde (1794). Oxford e Cambridge era, então, universidades «intelectualmente nulas.» [Hobsbawm, 1962, p. 39]

Todas estas vantagens da França e Estados alemães não foram suficientes para tomarem a dianteira na Revolução Industrial. Era na Grã-Bretanha que existia desde o século XVII uma monarquia constitucional, um parlamento que controlava os actos do governo, a aceitação do lucro privado e do desenvolvimento económico como objectivo governamental; que as terras estavam distribuídas por um número relativamente pequeno de proprietários que as exploravam com interesses comerciais, criando um excedente para as exportações que geravam uma acumulação de capital; que se tinha feito um forte investimento na construção naval, nas facilidades portuárias, nas estradas e nos canais; que maior expansão teve o fabrico de bens de grande consumo, principalmente têxteis, embora fabricados ainda da forma tradicional. A Grã-Bretanha, para além de uma economia sólida, possuía um Estado empenhado em captar mercados para além dos seus já vastos mercados coloniais.
Europa em 1792 2

Europa em 1792 2
O século XVIII foi também o século do Iluminismo, o século da razão e da experiência, contra as tradições religiosas baseadas na autoridade e na fé. Foi a época de rotura com as superstições do passado em que se procurava mais liberdade, humanidade e tolerância. Locke e Hume na Grã-Bretanha, Rosseau, Voltaire e Montesquieu em França, Goethe, Schiller e Kant na Alemanha (região), foram aguns dos representantes do Iluminismo. Tratava-se de um movimento contra a ordem estabelecida que proporcionou a base intelectual para a Revolução Francesa. Em geral, era na classe média que se encontravam os defensores do Iluminismo que pretendiam a abolição da ordem social e política instalada sem que, no entanto, fosse posta em causa a monarquia. Apesar de alguns monarcas terem apoiado ou impulsionado este movimento, como foi o caso de Frederico II da Prússia ou de José II da Áustria, os defensores do Antigo Regime, que eram a generalidade da nobreza e parte importante do clero, reforçaram as suas posições contra o avanço das ideias do Iluminismo dificultando as reformas sociais e económicas. Estes monarcas “esclarecidos” necessitavam do apoio da classe média para modernizar o Estado. Por outro lado, as monarquias absolutas, mesmo as que não repudiavam os princípios do Iluminismo, não mostravam vontade de romper com a ordem social e política estabelecida, isto é, não pretendiam abolir-se a si próprias e, por isso, a transformação foi sempre mais difícil.

O século XVIII foi um século de guerras sucessivas nas quais, com uma excepção, se manifestou continuamente o conflito entre a Grã-Bretanha e a França: 

  • Grande Guerra do Norte, 1700-1721;
  • Guerra da Sucessão de Espanha, 1701-1714;
  • Guerra da Quadrupla Aliança, 1718-1720;
  • Guerra da Sucessão Polaca, 1733-1738;
  • Guerra Austro-Russo-Turca, 1736-1739;
  • Guerra da Sucessão Austríaca, 1740-1748;
  • Guerra dos Sete Anos, 1756-1763;
  • Guerra da Independência dos Estados Unidos da América, 75-1783;
  • Guerras da Revolução Francesa, com início em 1792.

Todos estes conflitos envolveram potências europeias embora se tenham estendido às colónias ou, como a Guerra da Independência dos Estados Unidos, ocorreram exclusivamente fora da Europa. A generalidade dos conflitos incluíram operações terrestres e navais. Os conflitos acima indicados, no entanto, são aqueles que tiveram maior envolvimento das potências e consequências mais visíveis. Os Britânicos enfrentaram graves rebeliões na Irlanda de 1795 a 1797 e, novamente em 1798. Entre 1785 e 1787 houve uma guerra civil na Holanda. Em 1788 e até 1790, a Suécia e a Dinamarca envolveram-se numa guerra contra a Rússia nos territórios finlandeses. As guerras civis na Polónia resultaram na invasão daquele reino e partilhas do seu território, em 1772, 1793 e 1795, pela Áustria, Rússia e Prússia. A Rússia entrou em guerra contra a Pérsia em 1722-1723, enfrentou as guerrilhas no Cáucaso entre 1725 e 1736, entrou em guerra contra a Turquia em 1736-1739, em 1768-1774 e em 1787-1792. A Turquia enfrentou numerosas rebeliões na Grécia, no Egipto e na Síria Otomana, na Sérvia e na Transilvânia e, em 1798, viu o Egipto ser invadido pelas tropas francesas sob o comando de Napoleão Bonaparte. Não foram mencionados todos os conflitos armados. É por isso que Sir Michael Howard inicia a sua obra The Invention of Peace (A invenção da paz) citando o jurista Sir Henri Maine em meados do século XIX: «War appears to be as old as mankind, but peace is a modern invention.»

O século XVIII foi, realmente um século de guerras contínuas que se prolongaram nas Guerras da Revolução Francesa e nas Guerras Napoleónicas. Paul Kennedy dá-nos uma ideia da evolução da dimensão dos exércitos das grandes potências na época da Revolução Francesa. Com os dados que ele nos fornece é possível comparar a dimensão dos respectivos exércitos no início do século XVIII, no ano de início da Revolução Francesa e no ano da invasão da Rússia pelas tropas napoleónicas:

1710

1789

1812/1814

Grã-Bretanha

75.000

40.000

250.000

França

350.000

180.000

600.000

Império Habsburgo

100.000

300.000

250.000

Prússia

39.000

190.000

270.000

Rússia

220.000

300.000

500.000

A generalidade destas potências – a Holanda era uma excepção - eram monarquias, absolutas ou constitucionais, cujos soberanos reinavam sobre reinos ou impérios. O objectivo deste capítulo é dar uma visão sumária da situação da Europa na época da Revolução e, para isso, abordaremos primeiro cada uma das principais potências. 

 

O Sacro Império Romano Germânico

Esta entidade política existia desde 962, ano da coroação de Otto I da Saxónia. O Império consistia em ducados, condados e bispados em aliança formal com o Imperador. O Imperador era escolhido pelos membros do colégio eleitoral, os Eleitores, dignidade que era atribuída apenas a alguns dos governantes das muitas entidades políticas que compunham o Império. A partir de 1274, o Império permaneceu nas mãos da Casa (família) dos Habsburgos. No século XVIII, a Prússia, sob o governo de Frederico II, emergiu no seio do Império como uma potência alemã de primeira ordem. Em 1789 o Império englobava cerca de 1.800 regiões independentes. Estas regiões eram territórios governados por um príncipe ou duque e, em alguns casos, reis. Também existiam territórios sob o governo de um dignitário clérigo, como era o caso dos arcebispados de Colónia e Mogúncia, e as cidades livres imperiais, nas quais se contavam as cidades hanseáticas (Hamburgo, Bremen e Lübeck). O Eleitor de Hanôver era simultaneamente o Rei de Inglaterra. Nem todo o território do Reino da Prússia fazia parte do Império. O Império estendia-se, portanto, da Itália à Holanda e da Polónia aos Balcãs. Em 1793 incorporava cerca de 6.500.000 Alemães, 3.360.000 Checos, 2.000.000 de Valões de Flamengos, 1.000.000 de Polacos 900.000 Croatas, 700.000 Sérvios e numerosas pequenas nacionalidades.

O Imperador da Áustria governava os territórios húngaros, incluindo a Transilvânia, como Rei da Hungria. O exército à sua disposição era, assim, um exército multinacional, simultaneamente imperial e real (Kaiserlich-Königliche Armee). A administração central governava as partes do território de língua alemã. A Hungria era governada tinha o seu próprio parlamento (Dieta) que, à semelhança dos Países Baixos Austríacos, dos ducados Italianos e do Tirol, gozavam de grande autonomia excepto no que respeitava às relações internacionais.

Ao longo das Guerras da Revolução Francesa e, posteriormente, das Guerras Napoleónicas, o Império foi perdendo territórios. As principais entidades políticas, que interessam referir, eram as seguintes:

Arquiducado da Áustria

Era uma das mais importantes entidades política do Império. Com a capital em Viena, as suas fronteiras não eram exactamente como as da Áustria actual mas há coincidência na maior parte do território. Em 1789, o Arquiduque da Áustria era José II que morreu a 20 de Fevereiro de 1790. Sucedeu-lhe o seu irmão Leopoldo II que governou até 1 de Março de 1792, data da sua morte e ano em que teve início a guerra com a França. A partir daquela data, o Arquiducado foi governado por Francisco I da Áustria.

O Arquiduque da Áustria era, na altura, rei da Hungria, Rei da Croácia e Rei da Boémia. Os arquiduques da Áustria pertenciam à Casa de Habsburgo, também conhecida como Casa da Áustria, e eram, desde o século XIII, imperadores do Sacro Império Romano Germânico. O Arquiducado da Áustria esteve envolvido em guerra com a França desde as primeiras operações em 1792 até 1797 e desde 1799 até 1801. A Áustria governava os Ducados de Milão e de Mântua no Norte de Itália.

Reino da Boémia

Situava-se na parte ocidental da actual República Checa. Desde 1526 que o trono do Reino da Boémia pertencia à Casa de Habsburgo. Quando a França declarou guerra à Áustria, em 1792, a declaração foi entregue não ao Imperador do Sacro Império Romano Germânico mas ao Rei da Boémia e Hungria numa tentativa de limitar o número de Estados que se envolvessem na guerra.

Países Baixos Austríacos

Era um território sob domínio austríaco que correspondia em geral à actual Bélgica. O território englobava a Flandres, a Norte, e a Valónia, a Sul. A expressão Flandres designa normalmente o território baixo e plano do Norte da Bélgica e da França. Em 1787, revoltaram-se contra o domínio austríaco e a situação só foi reposta em Dezembro de 1790. Foi nesta região que tiveram início as operações militares no início da guerra (1792). Os Países Baixos Austríacos foram ocupados pelas tropas francesas em 1792 e 1793 e, após um perío do em que retiraram, entre 1794 e 1795. Neste ano, em Outubro, o território foi anexado à França.

Margraviato de Baden

Território ao longo do lado leste do rio Reno, no sudoeste da Alemanha. Era governado pelo Margrave Charles Frederick. O Margrave era originalmente um título medieval do comandante militar que tinha a missão de defender uma das províncias de fronteira do Império. Este título tornou-se hereditário e passou a ser usado pelos governantes de alguns principados imperiais. O Margraviato de Baden juntou-se à Primeira Coligação a 21 de Setembro de 1793, foi devastado pela guerra em 1796 e perdeu o território na margem esquerda do Reno.

Eleitorado da Baviera

Tratava-se de um ducado em que o governante era membro do colégio eleitoral do Sacro Império Romano Germânico, ou seja, era um Eleitor. O território correspondia de uma forma geral às actuais regiões da Alta Baviera, da Baixa Baviera e do Alto Palatinado do actual Estado da Baviera, Alemanha. Em 1792, as suas forças foram mobilizadas em apoio da Áustria mas, após uma derrota frente aos Franceses, foi assinado um armistício e a Baviera ficou fora da guerra. Na Guerra da Segunda Coligação a Baviera voltou a entrar na guerra ao lado da Áustria mas, após a derrota em Hohenlinden, estabeleceu a paz com a França.

Eleitorado de Hanôver

Desde 1714 que o Eleitor de Hanôver era o Rei de Inglaterra. As tropas de Hanôver intervieram juntamente com os Aliados no início da guerra mas, após a Prússia ter assinado o Tratado de Basileia (1795), adoptou uma posição de neutralidade.

Ducado de Brunswick

Karl William Ferdinand foi Duque de Brunswick entre 1780 1806 e comandou as tropas aliadas na invasão de França em 1792. O Ducado forneceu tropas aos aliados desde 1793.

Landegraviato de Hesse-Kassel

Território correspondente à região Norte do actual Estado de Hesse, Alemanha, com capital em Kassel. Sob governo do Duque Guilherme IX entre 1785 e 1808, juntou-se à Primeira Coligação a 10 de Abril de 1793. Após o Tratado de Basileia entre a França e a Prússia (1795), assinou um tratado de paz com a França em 28 de Agosto daquele ano e tornou-se um Estado neutral.

Landegraviato de Hesse-Darmastadt

Território correspondente à região Sul do Estado de Hesse, Alemanha, com capital em Darmstatdt. Sob governo do Duque Ludwig IX entre 1768 e 1830, juntou-se à Primeira Coligação a 5 de Outubro de 1793 e assumiu a neutralidade após o Tratado de Basileia entre a França e a Prússia. Em 1796 estabeleceu um tratado com o Reino Unido que lhe permitiu receber subsídios.

Reino da Prússia

A principal e mais forte entidade política dos territórios que vieram a formar a Alemanha em 1871. Com capital em Berlim desde 1451, foi governada pelo Rei Frederico Guilherme II entre 1786 e 1797, num sistema de monarquia absoluta. A Prússia foi cosignatária com a Áustria da Declaração de Pillnitz, em Agosto de 1791 e participou com um contingente de tropas na invasão da França em 1792. Até 1794 deu um contributo importante na guerra contra a França, com quem assinou o Tratado de Basileia em Abril de 1795.

Ducado de Würtemberg

Constituía a parte oriental do que é hoje o Estado de Baden-Würtemberg, Alemanha. Era governado pelo Duque Charles Eugene desde 1737 até 1793 e, a partir desta data, pelo Duque Ludwig Eugene até 1795. Em Abril de 1792 associou-se à Áustria na guerra contra a França. Aceitou o armistício em 1795 e assinou um tratado de paz em 1796.

Dinamarca

Península no Norte da Alemanha chamada Jutlândia, formada por um território muito plano e com numerosas ilhas. Encontra-se muito próxima da Península da Escandinávia. Até 1523 constituía uma união com a Suécia e a Noruega, a União de Kalmar que mantinha aqueles três reinos sob um único monarca. Nesta data, a Suécia saiu desta união mas a Dinamarca manteve-se unida à Noruega até 1814. A Dinamarca foi uma monarquia absoluta até 1849. Entre 1766 e 1808 foi governada pelo Rei Christian VII entre 1766 e 1808. Durante as Guerras da Revolução Francesa, a Dinamarca manteve-se neutral.

Reino da Grã-Bretanha

É normal referir o Reino da Grã-Bretanha por Inglaterra ou Reino Unido. O Reino da Grã-Bretanha existiu entre 1707 e 1800 com a união do Reino da Inglaterra e do Reino da Escócia. O Rei de Inglaterra era simultaneamente Rei da Escócia e Rei da Irlanda. Em 1801, com a aprovação dos respectivos parlamentos, formou-se o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda que sobreviveu até 1922. Sendo a Inglaterra a maior das três nações, o conjunto foi sempre mencionado por alguns autores como Inglaterra. Seja qual for a designação atribuída e seja qual for o Reino a que nos referimos, o monarca era, entre 1760 e 1820, o Rei George III. Sendo o reino Unido uma monarquia constitucional em que o parlamento já então exercia um apertado controlo sobre o governo do Reino, é natural que seja dada mais relevância aos nomes de alguns dos seus ministros do que acontecia com outros reinos. O primeiro ministro, designado na época por First Lord of the Treasury and Chancellor of the Exchequer, foi, entre 1783 e 1801, William Pitt. O estado de guerra com a França teve início a 1 de Fevereiro de 1793. Houve tropas britânicas em serviço no continente europeu entre 1793 e 1795 e em 1799. Em 1796, a França tentou, sem sucesso, lançar uma expedição na Irlanda.

República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos

Também conhecida como República Unida dos Países Baixos ou simplesmente Províncias Unidas, esta era a designação da Holanda que correspondia, em geral, ao actual território holandês. A República era governada pelo stadhouder que, entre 1751 e 1795, era o Guilherme V, Príncipe de Orange. A França invadiu as Províncias Unidas em Fevereiro de 1793 e, após ter retirado, voltou a invadir em 1794. Pelo Tratado de Haia (16 de maio de 1795), as províncias Unidas passaram a ser a República Batava, uma “república irmã” sob controle e ocupação francesa.

Suécia

Na época da revolução Francesa, a Suécia englobava o território que é hoje a Finlândia. Entre 1772 e 1809, a Suécia vivia a chamada Era Gustaviana. Gustavo III da Suécia, defensor do despotismo esclarecido, estabeleceu em 1772 uma monarquia absoluta. Assassinado em 1792, sucedeu-lhe o seu filho Gustavo Adolfo que é mencionado como Gustavo IV da Suécia. Apesar de Gustavo III ser claramente contra a Revolução Francesa, a Suécia permaneceu neutral na década de 1790.

Rússia

A Rússia era uma monarquia absoluta que controlava vasto território mas de extensão inferior ao actual. A expansão para Oriente estava longe de alcançar os seus limites. Nos limites da Rússia existiam numerosos povos que se integravam no Império Russo. Entre 1762 e 1796, a Rússia foi governada pela czarina Catarina II. Sucedeu-lhe o seu filho Paulo I que governou até 1801. A Rússia era o mais poderoso dos oponentes da Revolução Francesa. As tropas russas tiveram uma intervenção de relevo durante a Guerra da Segunda Coligação.

Espanha

A Espanha era uma monarquia absoluta e, na Península Ibérica, o seu território era muito semelhante ao actual. Em consequência da Guerra das Laranjas obteve de Portugal a região de Olivença. Quando começou a Revolução Francesa, encontrava-se no poder Carlos IV, monarca absoluto, que governou até 1788. Um dos seus principais ministros foi Godoy, entre 1792 e 1808. A Espanha juntou-se à Primeira Coligação após a declaração de guerra da França a 7 de Março de 1793. Após o Tratado de Basileia (Setembro de 1795) retirou-se da guerra e no ano seguinte, com o Tratado de Santo Idelfonso (Agosto de 1796) torna-se aliada ad França. Em Outubro desse ano, a Espanha declarou guerra ao Reino Unido.

Portugal

À semelhança da generalidade dos outros reinos europeus, Portugal era uma monarquia absoluta. No entanto, em 1777, com a subida ao trono de D. Maria I, foi afastado do governo o Marquês de Pombal, representante do despotismo esclarecido, que deu um forte contributo para o desenvolvimento do País. O seu afastamento não permitiu que «a sua obra fosse abolida, a não ser em pormenores de somenos importância. O despotismo era um facto, a burguesia, aliada à nova aristocracia, governava o País.» [Marques, 1973, p. 574] Portugal entrou na Primeira Coligação a 26 de Setembro de 1793. As tropas portuguesas foram enquadradas no Exército Espanhol, na Campanha do Rossilhão. Na Guerra da Segunda Coligação, voltou a colocar-se ao lado dos Aliados.

Polónia

A Polónia, juntamente com a Lituânia, formaram desde 1569 a República das Duas Nações, na realidade uma monarquia que, em 1791 adoptou a sua primeira Constituição. A república tornou-se, então, uma federação entre as duas nações. Foi um dos maiores e mais populosos Estados do século XVII e XVIII – além da Polónia e da Lituânia, englobava os territórios da Bielorrússia, Letónia, Estónia, parte da Ucrânia e a parte ocidental da actual Rússia – e a aprovação da Constituição preocupou os seus vizinhos Prussianos, Russos e Austríacos. O conflito com estas potências levou à ocupação do seu território e à sua ocupação por aqueles Estados em três fases: primeira partilha em 1772, segunda em 1793 e terceira em 1795. Neste ano, a Polónia deixou de existir como Estado independente e o seu território dividido pela Prússia, Áustria e Rússia. Os Polacos ofereceram uma resistência heróica mas a superioridade das forças invasoras ditou o resultado dos conflitos. Da parte dos Franceses, os Polacos mereceram a sua admiração pela resistência oferecida.

Suíça

Até ao ano de 1798 existia uma Confederação Helvética, inicialmente formada pela aliança entre as comunidades dos vales nos Alpes Centrais. A este núcleo inicial da Confederação juntaram-se algumas cidades (Lucerna, Zurique e Berna) que foram expandindo o seu território, aumentaram a sua influência noutras cidades. Em 1513 estava constituída uma confederação de treze cantões que se manteve até à invasão pelos Franceses em 1798. A Suíça manteve um papel neutral na Guerra da Primeira Coligação mas perdeu algum território quando se formou a República Cisalpina em 1797 (ver territórios na Itália). Em 1798 tornou-se a República Helvética, uma “república irmã” da França.

Império Otomano

O Império Otomano em 1792 estendia-se pela Península dos Balcãs, incluindo a Grécia, prolongava-se pela Ásia Menor até ao Mar Cáspio, abarcava alguns territórios da margem Norte do Mar Negro e um pequena faixa da Península da Crimeia, incluía a Mesopotâmia, o território desde a Síria até ao extremo sul da Península da Arábia, o Egipto e todo o Norte de África até Marrocos e uma faixa da África Oriental, desde o Egipto até parte da costa do Golfo de Adem. A parte do Império que se estendia pelo que é hoje a Síria, o Líbano, Israel e os territórios palestinianos era conhecida como Síria Otomana. Entre 1789 e 1807, governou o Sultão Selim III. O Império Otomano envolveu-se em guerra com a Rússia e a Áustria no início da década de 1790. O Egipto foi ameaçado pela expedição francesa sob comando do General Napoleão Bonaparte. A expedição francesa ao Egipto levou o Império Otomano a aliar-se com a Rússia (Dezembro de 1798) e com o Reino Unido (Jan de 1799). O Egipto era, na época, um Estado semi-independente, governado pelos Mamelucos.

Itália

No território do que é hoje a Itália existiam vários Estados e, entre eles os Estados Pontifícios. O Norte de Itália estava em grande parte sob controlo dos Austríacos, ou seja, faziam parte do Sacro Império Romano Germânico. Durante as Guerras da Revolução Francesa, criaram-se alguns Estados, transformaram-se outros e desapareceram alguns. Vejamos os principais Estados Italianos.

Reino da Sardenha

O Reino incluía, para além da ilha da Sardenha, os territórios da Savóia e Piemonte. O Reino da Sardenha era governado pela Casa de Savóia. Entre 1773 e 1796, foi Rei da Sardenha Victor Amadeu III. Entre 1796 e 1802, foi Rei da Sardenha Carlos Emanuel IV. O Reino da Sardenha entrou na guerra contra a França em 1792. No final desse ano, os Franceses invadiram Savóia e Nice no final desse ano. Em 1793m o Reino da Sardenha juntou-se à Primeira Coligação. Após as derrotas sofridas perante as tropas francesas sob o comando de Napoleão Bonaparte foi assinado um tratado de paz (Maio de 1796) segundo o qual a França ficava na posse de Nice e Savóia. Em 1798, Turim e as outras principais cidades do Reino foram ocupadas pelas tropas francesas. Foi estabelecida uma constituição republicana, o Rei partiu para a Sardenha, mas o Directório (uma das formas de governo da República Francesa; ver capítulo III) entendeu anexar o território do Piemonte.

Ducado de Milão

Embora o território do Ducado tenha variado ao longo dos séculos, cobria em geral grande parte da Lombardia, incluindo as cidades de Milão e Pavia. Ocupava ainda algumas regiões do Piemonte, Emília-Romanha e Toscana e também da Suíça. Em 1708, o Ducado de Milão anexou o Ducado de Mântua. O Ducado de Milão encontrava-se sob domínio austríaco até ser conquistado por Napoleão Bonaparte na Guerra da Primeira Coligação.

Ducado de Modena e Reggio

Existia nos territórios das actuais províncias italianas de Modena e Ferrara. Entre 1780 e 1796 foi governado pelo Duque Ercole III. Nos anos de 1795 e 1796, o Ducado foi envolvido no conflito no Norte de Itália e foi ocupado pelas tropas francesas. A 12 de Maio de 1796 foi assinado um armistício com os Franceses. No entanto, a agitação política levou a uma intervenção militar francesa e o Ducado foi integrado na República de Cispadana, estado satélite criado por Napoleão Bonaparte em Dezembro de 1796, no Norte de Itália.

Reino de Nápoles

Compreendia a parte Sul da Península Itálica. Não compreendia a Sicília que era território do Reino da Sicília. Ambos os reinos tinham o mesmo soberano mas permaneceram constitucionalmente separados. Entre 1759 e 1825, ambos os reinos tinham como soberano o Rei Fernando IV que, pela união pessoal dos dois reinos também era conhecido como Rei da Sicília ou Rei das duas Sicílias. A 18 de Novembro de 1792, o Rei Fernando IV reconheceu a República Francesa mas em meados do ano seguinte aliou-se com a Grã-Bretanha na guerra contra a França. Foi assinado um armistício em Junho de 1796 e em Outubro um tratado de paz. Em 1798, durante a Guerra da Segunda Coligação, aliou-se à Grã-Bretanha, à Rússia e à Áustria. O Rei Fernando IV fez uma tentativa de expulsar os Franceses da República Romana (formada pelos Franceses em 1798-1799) mas o reino de Nápoles foi invadido pelas tropas francesas que formaram a República Partenopeana de duração efémera. O Reino foi restabelecido em 1799.

Ducado de Parma e Piacenza

Ocupava o território das actuais províncias de Parma e Piacenza. Entre 1765 e 1802, o Ducado foi governado pelo Duque Fernando I de Parma, da família dos Bourbons. O Ducado foi ocupado pela França no início de 1796 e juntou-se à Segunda Coligação em Dezembro de 1798.

Grão-ducado da Toscana

Com a capital em Florença, o seu território correspondia aproximadamente à actual província italiana da Toscana. Entre 1765 e 1790, foi governado pelo Grão-duque Leopoldo I. Entre 1790 e 1801, foi governado pelo Grão-duque Fernando III. Embora fosse um feudo da Áustria, conseguiu, entre 1792 e 1795, manter uma posição de neutralidade. O facto de os Britânicos utilizarem o porto de Livorno levou os Franceses a ocuparem o território em Junho de 1796. Foi assinado um Tratado com a França e declarada a neutralidade em Março de 1797. Em Março de 1799 voltou a ocupar o Ducado mas foi obrigada a retirar devido à pressão militar das tropas russas e austríacas da Segunda Coligação.

República de Veneza

Chamada Sereníssima República de Veneza, era um Estado italiano com capital em Veneza. Foi governada, entre 1779 e 1789, pelo doge (o primeiro magistrado da República) Paolo Renier e, entre 1789 e 1797, pelo doge Luigi Manin. Em 1793 reconheceu a República Francesa e permaneceu neutral o que não impediu que o seu território fosse dividido, pelo Tratado de Campo-Formio, entre a França, a República Cisalpina (fundada em 1797 pelos Franceses) e a Áustria.

Estados Pontifícios

No centro da Península Itálica existia um conjunto de territórios que constituíam um Estado com capital em Roma e sob a autoridade civil do Papa. Era um dos maiores Estados de Itália. Incluiu as regiões de Lazio, Marche, Umbria, Romagna e parte de Emilia. Estes territórios representavam a manifestação do poder temporal do Papa. Entre 1775 e 29 de Agosto de 1799, governou o Papa Pio VI. A 14 de Março de 1800 foi eleito o Papa Pio VII que governou até 1823. As relações diplomáticas com a França foram cortadas devido ao estatuto que atribuído ao clero e pela anexação de Avinhão, pertencente ao Papa, em 1791. Após a invasão dos Estados Pontifícios por Napoleão em Junho de 1796, alguns territórios passaram a pertencer à República Cispadana. Em 11 de Janeiro de 1798 foi proclamada a República Romana que acabou por ser abandonada pelos Franceses durante a Guerra da Segunda Coligação.

 

Bibliografia

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