1915 - A Frente Ocidental
UMA GUERRA DE TRINCHEIRAS
A Frente Ocidental entrou em 1915 com uma fronteira bem definida entre os Aliados e as Potências Centrais. Nunca uma fronteira tinha sido definida de forma tão marcada na Europa por um sistema de fortificações tão extenso, tão profundo e tão elaborado [KEEGAN,p. 175]. Este sistema foi o resultado dos sucessivos fracassos mútuos das tentativas de envolver o flanco norte do adversário e da necessidade de aumentar significativamente a proteção perante a falta de recursos adequados para enfrentar o grande poder de fogo da artilharia e o número crescente de metralhadoras. Estendia-se esta fronteira desde Nieuport, na Bélgica, até à fronteira com a Suíça; ganhou profundidade ao serem construídas segundas, terceiras ou mais linhas de trincheiras e posições defensivas e pelo alcance que a artilharia lhe conferia; elaboraram-se sistemas de proteção coletiva cada vez mais complexos, à medida que se adivinhava o tempo que seria necessário mantê-los. A separar as linhas de trincheiras das forças aliadas e alemãs, ficava a terra de ninguém, com 200 a 250 metros de largura, mas em alguns pontos, com apenas 25 metros.
Criou-se desta forma, em cada um dos lados, um sistema com várias linhas de trincheiras ligadas entre si por trincheiras de comunicação. As conquistas de terreno conseguidas por cada uma das partes foram, aparentemente, insignificantes. Por vezes, foi feito um enorme esforço e perderam-se inúmeras vidas na conquista de poucos quilómetros quadrados, mas nesse território conquistado podia existir, por exemplo, uma colina importante porque dominava uma zona ocupada pelo inimigo.
Comparativamente com o ano de anterior, em 1915 registaram-se poucas batalhas com dimensão significativa. No entanto, as batalhas duraram mais tempo e, se os ganhos territoriais foram pequenos, as perdas humanas e materiais foram enormes. A guerra deixou de ser uma guerra de manobra - de movimento - para se tornar numa guerra de posições. As linhas de trincheiras, longas proteções coletivas, portanto, imóveis, em que o soldado procurava a proteção do poder de fogo da artilharia e das metralhadoras, favoreciam a defesa. Quando executavam uma ofensiva, ambas as partes orientavam o ataque sobre a frente inimiga. Não há flancos sobre os quais se possa executar um envolvimento. O flanco norte é o mar e o flanco sul a Suíça. A solução é romper uma posição defensiva inimiga, alargar a brecha assim criada e destruir a continuidade do dispositivo defensivo do adversário, isto é, utilizar a penetração como forma de manobra ofensiva.
Em 1915, tal como hoje, este tipo de manobra implica sempre um número mais elevado de baixas e, por isso, ambas as partes, aliados e alemães, procuraram desenvolver formas de obter mais facilmente sucesso na ofensiva e resolver o problema da imobilidade a que o tipo de guerra das trincheiras obrigava. Foi com esta finalidade que, neste ano, se introduziu uma nova arma - o gás - apesar das potências em conflito serem subscritoras das convenções internacionais que proíbiam a sua utilização.
A Frente Ocidental em 1915. Fonte: https://www.westpoint.edu/sites/default/files/inline-images/academics/academic_departments/history/WWI/WWOne11.pdf
Após a Batalha do Marne (5 a 12 de setembro de 1914), os alemães compreenderam que o Plano Schlieffen tinha fracassado. Tentaram então aplicá-lo ao contrário transferindo tropas da Frente Ocidental para a Frente Oriental esperando derrotar definitivamente a Rússia. Esta medida enfraqueceu as posições alemãs na Frente Ocidental e o General Joseph Joffre, o comandante militar francês, procurou explorar essa situação planeando as ofensivas nas regiões de Artois e Champagne.
No ano de 1915 ainda se combatia naquela que ficou conhecida como Primeira Batalha de Champagne (20 dezembro 1914 – 17 março 1915). Ainda esta batalha não tinha terminado e já se iniciavam os confrontos relevantes deste ano. Em termos muito gerais, esses confrontos podem ser resumidos da seguinte forma:
- Uma ofensiva britânica, de 10 a 13 de março, a Batalha de Neuve Chapelle;
- Uma ofensiva alemã, entre 22 de abril e 25 de maio, que ficou conhecida como Segunda Batalha de Ypres, mas que, tal como noutras ofensivas, foi um conjunto de batalhas:
- Uma ofensiva franco-britânica, de 9 de maio a 18 de junho, conhecida como Segunda Batalha de Artois;
- Uma nova ofensiva franco-britânica, no outono, dividida em duas batalhas principais: a Terceira Batalha de Artois (15 de setembro a 4 de novembro) e a Segunda Batalha de Champagne (25 de setembro a 6 de novembro).
Será dado destaque à Batalha de Neuve Chapelle porque constitui um bom exemplo das causas de muitos fracassos na Frente Ocidental. A ofensiva alemã - Segunda Batalha de Ypres - foi na realidade um conjunto de várias batalhas menores das quais só iremos destacar a Batalha de Gravenstafel (22 e 23 de abril) por ser aquela em que, pela primeira vez, na Frente Ocidental, foi utilizado um gás venenoso. Destaquei a expressão "pela primeira vez" porque existe sobre este assunto alguma controvérsia que adiante referiremos. Por fim, faremos uma referência mais detalhada à Batalha de Loos (25 a 28 de setembro), integrada na Terceira Batalha de Artois, em que as forças britânicas iniciaram a sua ofensiva com utilização de gás, à semelhança do que os alemães tinham feito em abril.
BATALHA DE NEUVE CHAPELLE
Neuve Chapelle é uma comuna francesa localizada no departamento de Pas-de-Calais, na região de Hauts-de-France. Antes desta batalha, a vila estava na posse dos alemães.
A Batalha de Neuve Chapelle foi iniciada a 10 de março de 1915 e foi uma ofensiva britânica que, inicialmente, deveria fazer parte de uma operação ofensiva mais vasta, na região de Artois (esta região administrativa deixou de existir e foi integrada na Região de Hauts de France), em conjunto com as forças francesas. Nesta fase da guerra, os britânicos estavam a reunir tropas para o desembarque na Península de Gallipoli, na região dos Dardanelos. Por esta razão, os reforços britânicos, previstos para libertarem forças francesas em Ypres, atrasaram-se. Não podendo dispor das forças francesas em Ypres, O General Joseph Joffre, Comandante-em-Chefe das forças francesas, decidiu adiar a ofensiva. O General John French, comandante da Força Expedicionária Britânica (BEF), decidiu manter os seus planos e demonstrar as capacidades ofensivas das forças britânicas que, até aí, se tinham mantido quase sempre na defensiva.
O objetivo do ataque britânico era capturar a linha de alturas de Aubers Ridge e ameaçar as posições alemãs em Lille. Em primeiro lugar, era necessário romper a primeira linha de defesa alemã, após o que avançariam sobre Aubers. Esta missão seria executada pelo Primeiro Exército britânico, com um efetivo de aproximadamente 60.000 homens, sob comando do General Douglas Haig.
O Primeiro Exército britânico era formado por quatro divisões agrupadas em dois corpos de exército (CE):
- IV CE, sob comando do General Sir Henry Rawlinson, constituído pelas 7ª e 8ª Divisões;
- CE Indiano, sob comando do General James Willcock, constituído pelas Divisões Meerut e Lahore.
As forças alemãs que defendiam as posições na primeira linha de defesa pertenciam a uma Divisão formada por dois regimentos de infantaria e a um batalhão Jäger, pertencentes ao Sexto Exército alemão. O seu efetivo era cerca de um sétimo da força dos britânicos.
Os ataques, iniciados às 07H35, após uma breve preparação de artilharia que durou trinta e cinco minutos, permitiram romper a linha de defesa alemã e capturar Neuve Chapelle em pouco tempo de combate. No entanto, após este sucesso inicial, as forças britânicas tiveram problemas de comunicações, o que dificultou muito a coordenação das operações, e também dificuldades no apoio logístico. Estes problemas não permitiram uma rápida exploração do sucesso e obrigaram a uma paragem no avanço britânico.
Entretanto, o Príncipe Herdeiro da Baviera, Rupprecht, comandante do Sexto Exército alemão, movimentou forças de reserva para a frente e lançou um contra-ataque no dia 12. As tropas britânicas defenderam-se bem e conseguiram manter o terreno conquistado inicialmente, mas o avanço para Aubers foi abandonado no dia 13. Estava definida uma nova linha de trincheiras, não muito diferente da anterior. Os britânicos conquistaram apenas dois quilómetros quadrados de terreno com a perda de cerca de 13.000 homens (mortos, feridos e desaparecidos ou prisioneiros). As forças alemãs do Sexto Exército terão tido baixas semelhantes.
Batalha de Neuve Chapelle (10 - 13 março 1015). O traço contínuo representa as posições iniciais britânicas; a tracejado, as posições no fim da batalha. Fonte: https://www.meisterdrucke.pt/kunstwerke/1200w/Unbekannt_-_The_Battleground_of_Neuve_Chapelle_First_World_War_1915_c1920_-_%28MeisterDrucke-711084%29.jpg
Para mais informação ver:
- https://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_Neuve_Chapelle
- https://www.longlongtrail.co.uk/battles/battles-of-the-western-front-in-france-and-flanders/the-battle-of-neuve-chapelle/
- https://www.nam.ac.uk/explore/1915-early-trench-battles
- https://www.ww1battlefields.co.uk/pages/others/neuve_chapelle_short.html
- https://www.firstworldwar.com/battles/neuvechapelle.htm
Fotografia aérea
O Royal Flying Corps (RFC) foi o embrião da força aérea britânica, a Royal Air Force, que seria criada a 1 de abril de 1918. Em agosto de 1914, o RFC tinha quatro esquadrões operacionais que compreendiam 63 aeronaves. No início da guerra, formaram-se na Grã-Bretanha mais três esquadrões. Convém lembrar que, naquela altura, tinham decorrido apenas onze anos e meio sobre o primeiro voo tripulado de uma aeronave mais pesada que o ar, um aparelho com motor, realizado pelos irmãos Wright, nos Estados Unidos da América, a 17 de dezembro de 1903, um voo de 37 metros. A partir de novembro de 1914, cada um dos exércitos da British Expeditionary Force (BEF) era apoiado por dois esquadrões. O Primeiro Exército britânico era apoiado por 24 aviões. As missões atribuídas às unidades do RFC eram realizadas maioritariamente no âmbito do reconhecimento e da observação para regular os fogos de artilharia. Também realizavam missões de bombardeamento, mas ainda à custa de muita improvisação. Os franceses dispunham de aeronaves e equipamentos de qualidade superior e em maior número na sua Aéronautique Militaire. Em maio de 1915, os britânicos dispunham de 166 aeronaves na Frente Ocidental, um número modesto quando comparado com as 1.150 aeronaves francesas.
A primeira fotografia do mundo foi oficialmente tirada por Joseph Nicéphore Niépce, em 1826. Houve um grande desenvolvimento e hoje podemos observar excelentes fotografias tiradas durante a Guerra da Crimeia (1853-1856). Sobre a Primeira Guerra Mundial abundam as fotografias e filmes à nossa disposição e que nos podem dar uma ideia das máquinas fotográficas da época. Tirando as fotografias a partir de um avião, seria possível mapear as linhas de trincheiras inimigas e detetar os pontos onde a defesa se previa ser mais forte. As ações de foto-reconhecimento foram uma constante durante o conflito. Os equipamentos que se utilizavam eram ainda muito pesados e os aviões muito frágeis, o que tornava difícil manter um voo estável em linha reta e abaixo das nuvens, ao longo das linhas inimigas. Em 1915, já a artilharia antiaérea atingira um grau considerável de desenvolvimento. Os alemães utilizavam para o efeito peças de artilharia de 75 e 80 mm. Se o teto de nuvens se encontrasse mais baixo, os voos de reconhecimento ficariam mais expostos, não só à artilharia, mas também ao crescente número de metralhadoras que começaram a ser utilizadas em suportes adequados ao tiro antiaéreo.
A ofensiva britânica foi cuidadosamente preparada. Para esse efeito, foi realizado um reconhecimento aéreo e foi fotografada a frente de ataque até uma profundidade de 1.400 metros. Com as imagens obtidas, foram feitos mapas na escala 1:5.000, distribuídos pelas subunidades do Primeiro Exército britânico. Para uma melhor compreensão das condições e dos resultados obtidos com as fotografias aéreas recomendo as seguintes páginas na Internet:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Reconhecimento_a%C3%A9reo_na_Primeira_Guerra_Mundial
As tropas indianas
O Primeiro Exército britânico era constituído por dois corpos de exército, cada um por duas divisões de infantaria. Um dos corpos de exército, como vimos, era constituído por duas divisões de infantaria indianas. As primeiras unidades da Força Expedicionária Indiana "A" deixaram a Índia a 24 de agosto com destino à França, mas passaram primeiro pelo Egito. Chegaram ao Suez no dia 9 de setembro e desembarcam em Marselha no dia 26 desse mês. Mais de um milhão de indianos foram mobilizados para a Primeira Guerra Mundial e estiveram presentas na Frente Ocidental onde lutaram contra a Alemanha, em Gallipoli e no Médio Oriente – Mesopotâmia, Síria, Palestina - em luta contra os alemães, o Império Otomano, na Ásia Central – Pérsia – também contra os turcos, e na África Oriental Alemã, atual Tanzânia, onde enfrentaram as tropas alemãs e africanas de Paul Emil von Lettow-Vorbeck. O contributo indiano para a causa dos Aliados foi de uma enorme importância.
A Força Expedicionária Indiana A, sob o comando do General Sir James Willcocks, foi a força indiana destacada para a Frente Ocidental onde ficou integrada na Força Expedicionária Britânica (BEF). Era constituída por dois corpos de exército:
- I Indian Corps, composto por duas divisões de infantaria: a 3.ª Divisão de Infantaria (Lahore) e a 7.ª Divisão de Infantaria (Meerut); esta força foi enviada para a Mesopotâmia em dezembro de 1915;
- Indian Cavalry Corps, composto pela 1.ª Divisão Indiana de Cavalaria (em 1916 passou a denominar-se 4.ª Divisão de Cavalaria) e pela 2.ª Divisão Indiana de cavalaria (em 1916 passou a denominar-se 5.ª Divisão de Cavalaria).
Ao chegar a Marselha em 26 de setembro de 1914, a Força Expedicionária Indiana foi transferida para o saliente de Ypres e participou na Batalha de La Bassée, em outubro de 1914. Em março de 1915, a 7.ª Divisão (Meerut) foi escolhida para liderar o ataque na Batalha de Neuve Chapelle.
Para mais informação ver:
- https://en.wikipedia.org/wiki/Indian_Army_during_World_War_I
- https://encyclopedia.1914-1918-online.net/article/indian_expeditionary_force
SEGUNDA BATALHA DE YPRES
A Segunda Batalha de Ypres é a designação para a ofensiva alemã, lançada entre 22 de abril e 25 de maio de 1915, na região de Ypres, Bélgica. Os historiadores militares identificam, nesta ofensiva, quatro confrontos de maior intensidade, apresentados como "batalhas":
- Batalha de Gravenstafel (22 e 23 de abril);
- Batalha de St. Julien (24 de abril a 4 de maio);
- Batalha de Frezenberg (8 a 13 de maio);
- Batalha de Bellewaarde (24 e 25 de maio).
Como resultado desta ofensiva, os alemães ganharam algum território e reduziram significativamente a área ocupada pelos Aliados no "Saliente de Ypres". A caraterística mais significativa desta ofensiva foi a utilização, pelas tropas alemãs, de gás venenoso, o cloro.
A linha defensiva em redor de Ypres estava guarnecida por tropas canadianas, britânicas e francesas, que incluíam tropas argelinas. Os franceses ocupavam a parte norte da linha com duas divisões. À direita dos franceses encontrava-se uma divisão canadiana e à direita desta, duas divisões britânicas. Os ataques alemães lançados 22 de abril (Gravenstafel), 24 de abril (St. Julien) e 24 de maio (Bellewaarde) foram iniciados com a utilização de gás venenoso.
No final da Segunda Batalha de Ypres, os Aliados tinham perdido cerca de 70.000 homens e os alemães à volta de 35.000. Estas perdas (baixas) referem-se a mortos, feridos e desaparecidos ou prisioneiros. Das baixas registadas pelos Aliados, cerca de 27.500 eram franceses e destes, 18.000 respeitam ao dia 22 de abril, em Gravenstaffel. Apesar de as unidades aliadas terem sido obrigadas a recuar e terem perdido terreno para os alemães, estes acabaram por interromper a ofensiva, a 25 de maio, perante a forte resistência dos Aliados.
Batalha de Gravenstafel
No dia 22 de abril de 1915, às 17H00 (18H00 para os alemães), Ypres e as aldeias em redor foram bombardeadas pela artilharia alemã. Entre as bocas de fogo disponíveis, encontrava-se um obus de calibre 420 mm, designado por Dicke Bertha, localizado na Floresta de Houthulst, a norte de Ypres. O rebentamento da granada disparada pelo obus de 420 mm era o sinal para a abertura das válvulas das garrafas (cilindros) de gás cloro. Os canos de chumbo encaminharam o gás para fora da trincheira, o gás formou uma nuvem esverdeada que o vento empurrou na direção das trincheiras francesas. A libertação das 150 toneladas do cloro contido nos 5.830 cilindros demorou dez minutos e abrangeu uma frente com cerca de seis quilómetros de extensão, de Steenstraat a Poelcapelle.
O principal objetivo do ataque de 22 de abril (Batalha de Gravenstafel) eram as linhas francesas, apanhadas desprevenidas. Sem meios para se protegerem de um ataque deste tipo, o número de baixas foi elevado. Nos outros dois ataques em que os alemães utilizaram o gás, dias 24 de abril e 24 de maio, as tropas já utilizaram meios improvisados para se protegerem do cloro e foi possível garantir maior resistência.
Um oficial alemão escreveu: «Uma nuvem de fumo verde e venenosa saía das trincheiras da primeira linha até onde a vista alcançava.» Os militares de vigilância notaram uma curiosa nuvem verde-amarelada que se aproximava lentamente da sua linha, mas não associaram esse fenómeno à sua verdadeira causa. Os franceses suspeitaram que a nuvem servia apenas para mascarar um avanço da infantaria alemã e foi ordenado aos homens que ocupassem as suas posições nas trincheiras, preparando-se para um provável ataque. A infantaria alemã avançava realmente a alguma distância da nuvem de cloro, mas foi o gás que provocou de imediato mais vítimas, destruindo os seus órgãos respiratórios e provocando, assim, a asfixia. Isto não deveria ter sido uma novidade para os franceses que, alguns dias antes, tinham capturado dois soldados alemães que revelaram o uso iminente do gás na Frente Ocidental, mas não foi dada a importância devida a estas informações.
O ataque com gás às linhas de defesa ocupadas pelos franceses foi tão bem-sucedido que surpreendeu os próprios alemães. A maioria das tropas francesas (territoriais franceses e argelinos) que não caíram devido à ação do gás, retiraram em grande confusão. A infantaria alemã, que tinha iniciado o seu avanço às 17H15, após todo o gás ter sido libertado, penetrou com sucesso na linha da frente dos Aliados. Ao fim de uma hora, a 52ª Divisão da Reserva alemã atingiu o terreno elevado de Pilckem Ridge. As 45ª e 46ª Divisões da Reserva alemãs atingiram o Canal do Yser e conseguiram estabelecer testas de ponte na margem ocidental, em Steenstraat. Tinha sido criada, assim, uma brecha perigosa na linha da frente dos Aliados, deixando aberto o caminho para Ypres.
Como resultado da retirada das forças francesas e do avanço alemão na brecha criada na linha de defesa dos Aliados, o flanco esquerdo da 1ª Divisão canadiana ficou exposto. Contudo, não esperando um sucesso tão rápido, os alemães não exploraram o sucesso com as forças adequadas e os objetivos atingidos foram modestos, perante uma situação altamente favorável. Perante este perigo, o 13º Batalhão canadiano, com algumas forças francesas, montaram uma defesa eficaz no flanco esquerdo do sector britânico e conseguiram impedir o progresso da 51ª Divisão da Reserva alemã, que avançava na ala esquerda do dispositivo alemão. Às 20H00, os franceses lançaram um contra-ataque sobre Pilckem, a partir de Boesinghe, mas não obtiveram sucesso. Às primeiras horas da manhã do dia 23 de abril, a 3ª Brigada de Infantaria canadiana contra-atacou, mas os resultados ficaram aquém do desejado e as tropas de ambos os lados estabeleceram novas linhas defensivas.
Os resultados mais significativos desta batalha foram conseguidos com a utilização do gás. Cobrindo seis quilómetros de linhas de trincheiras, foram afetados pelo gás cerca de 10.000 soldados. Metade destes homens morreu dez minutos após o gás atingir a linha de frente. A morte foi causada por asfixia. Os que sobreviveram ficaram temporariamente cegos e foram acometidos de fortes ataques de tosse. Os que conseguiram retirar, fizeram-no em grande desordem, tropeçando e perdendo-se na confusão. Cerca de 2.000 desses militares foram capturadas pelos alemães.
Para mais informação, ver as páginas seguintes, onde se podem observar variados mapas e fotografias:
- https://www.canadiansoldiers.com/history/battlehonours/westernfront/gravenstafel.htm
- https://www.canada.ca/en/department-national-defence/services/military-history/history-heritage/battle-honours-honorary-distinctions/gravenstafel.html
- http://www.greatwar.co.uk/battles/second-ypres-1915/index.htm
- https://www.dvsww2.ca/1915/1915ypres2.htm
Gassed, 1919, por John Singer Sargent
As armas químicas
As armas químicas não foram utilizadas pela primeira vez na Primeira Guerra Mundial. Existem provas da existência de formas de guerra química e biológica nos tempos antigos e clássicos. Diz-se que Sólon de Atenas usou raízes de heléboro (um purgativo) para envenenar a água de um aqueduto, por volta de 590 a.C., durante o cerco de Cirrha. Documentos chineses do século IV a.C. falam da utilização de mostarda e outras matérias vegetais tóxicas para produzirem fumos tóxicos. Esparta, numa das suas guerras com Atenas, utilizou o fumo resultante da queima de madeira mergulhada numa mistura de alcatrão e enxofre. A lista de utilizações de produtos químicos tóxicos para produzir fumos, envenenar água ou as pontas das flechas, ou outras formas de causar dano ao inimigo, é longa. O que encontramos pela primeira vez na Grande Guerra de 1914-1918 é a utilização massiva deste tipo de armas.
A incapacidade de cada um dos oponentes para efetuar uma operação de envolvimento da força adversária conduziu ao sistema das extensas linhas de trincheiras que só era possível derrotar por meio de um ataque frontal, o que só deveria ser realizado contra uma força inimiga francamente mais fraca. O que se pretendia era penetrar no dispositivo inimigo e conquistar um objetivo no interior desse dispositivo, por forma a desfazer a continuidade da sua defesa e explorar este sucesso com as forças de reserva. Ora, a nova realidade do campo de batalha, com a grande densidade de fogos de artilharia e de metralhadoras, não favorecia de forma nenhuma o atacante que se sujeitava a um número elevadíssimo de baixas para conquistar, em caso de "sucesso", poucos metros quadrados de terreno. Era necessário encontrar uma fórmula para ultrapassar este impasse e reconquistar o movimento. Neste caso, as potências de ambos os lados do conflito decidiram ignorar as Convenções e Declarações assumidas nas Conferências de Paz, em Haia, nos anos de 1899 e 1907.
Há alguma controvérsia sobre as primeiras utilizações do gás, na Primeira Guerra Mundial. Michael Duffy [firstworldwar.com, Weapons of War - Poison Gas] afirma que a primeira utilização de gás contra as forças inimigas foi feita pelos franceses, no primeiro mês de guerra, em 1914. A artilharia francesa terá disparado granadas que continham um gás lacrimogéneo. Em outubro desse ano, os alemães fizeram experiências com um gás irritante colocado em pequenos recipientes metálicos no interior de granadas shrapnel (granadas anti-pessoal de artilharia). A sua utilização terá sido feita perto de Neuve Chapelle, contra as tropas francesas que, no entanto, não sentiram os efeitos do gás. [POPE & WHEAL, «Gas», p. 187] A 31 de janeiro de 1915, na Batalha de Bolimov, na Frente Leste, opondo alemães e russos, os alemães utilizaram granadas que continham um gás lacrimogéneo, mas a experiência não correu bem, por duas razões. Em primeiro lugar, a alteração da direção do vento empurrou o gás na direção das tropas alemãs. Em segundo lugar, com sorte para o lado alemão, faziam-se sentir temperaturas muito baixas e o gás congelou, caindo inofensivamente no chão. [DUFFY, «The Battle of Bolimov, 1915»]
Apesar dos insucessos iniciais, os alemães continuaram a investigar possíveis utilizações de um novo gás lacrimogéneo, que foi utilizado contra os franceses, em Nieuport, em março de 1915. Não obtendo os resultados desejados, desenvolveram um sistema para a utilização do gás cloro, o que aconteceu, com sucesso, a 22 de março, no Saliente de Ypres. A utilização do gás cloro provocou de imediato a condenação generalizada. O Chefe do Estado-Maior General alemão, General Erich von Falkenhayn, justificou a utilização destes meios como uma resposta aos franceses e britânicos «que utilizaram granadas de obus carregadas com gás com efeitos asfixiantes, e que nós chamamos "panelas fedorentas" (Stinklöpfe), as frequentes indicações da imprensa francesa sobre o emprego próximo de um gás descoberto por um físico célebre e cujo efeito era aniquilante, as graves feridas causadas pelas granadas de obus carregadas com fósforo (incendiárias), o envenenamento resultante das granadas de obus britânicas carregadas com picrina (Cloropicrina, uma espécie de gás lacrimogéneo), colocou de novo a nossa atenção sobre esta arma.» [GILLEMINAULT, pp. 174-175] No entanto, David Lloyd George, então o Chanceler do Tesouro britânico, manifestou o seu desacordo com esta análise: «A 17 de abril, cinco dias antes de utilizarem eles próprios [as armas químicas, em Ypres], os Alemães publicaram a falsa notícia que os Ingleses utilizaram granadas de obus e bombas com gás asfixiante. Esta acusação foi calculada para lhes servir de desculpa na véspera do dia em que iam empregar esses cruéis engenhos.» [GILLEMINAULT, pp. 164-165] Os britânicos utilizaram largamente os ataques alemães com gás na sua propaganda, mas estavam já a planear responder da mesma forma, o que aconteceu a 24 de setembro, na Batalha de Loos.
Para mais informação ver:
- https://encyclopedia.1914-1918-online.net/article/gas_warfare
- https://www.kumc.edu/school-of-medicine/academics/departments/history-and-philosophy-of-medicine/archives/wwi/essays/medicine/gas-in-the-great-war.html
- https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/0310057X1604401S05
- https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-3-319-51664-6_9
- https://www.firstworldwar.com/weaponry/gas.htm
A proteção das tropas contra o gás
Um dos artigos indispensáveis para o soldado da Primeira Guerra Mundial era a sua máscara de gás. Contudo, e apesar de serem conhecidas as intenções de ambos os lados, estes equipamentos de proteção não estavam distribuídos às tropas. As primeiras máscaras de gás do exército eram pouco mais que ataduras de gaze com laços. Estes seriam humedecidos com água para melhorar sua eficácia na filtragem do gás. A 3 de maio, os britânicos começaram a enviar algodão envolto em musselina para suas tropas. Logo a seguir passaram a utilizar o "respirador Black Veil", inventado por John Scott Haldane. Era uma almofada de algodão embebida numa solução absorvente (hipossulfato de sódio, carbonato de sódio, glicerina e água) que era fixada sobre a boca com um véu de algodão preto. O Black Veil Respirator depressa foi substituído pelo British Smoke Hood, um capuz de lona tratado com produtos químicos para absorção de cloro, inventado em 1915 por Cluny MacPherson (1879 - 1966), natural de Newfoundland.
Soldados franceses com máscaras improvisadas, 1915.
Fonte: Unbekannt_-_French_soldiers_in_improvised_gas_masks_1915_-_(MeisterDrucke-793539).jpg (791×1024)
A British Smoke Hood era também conhecida como "capuz MacPherson" e tinha um filtro de algodão embebido em substâncias químicas para neutralizar os gases. No entanto, a máscara antigás mais famosa e amplamente utilizada durante a Primeira Guerra Mundial foi a "máscara de gás de filtro", desenvolvida por Edward Frank Harrison (1869-1918), em 1915. Essa máscara consistia num respirador facial de borracha que cobria o nariz e a boca do utilizador e possuía um filtro especializado para purificar o ar respirado. Esta máscara de gás foi desenvolvida para proteger contra gás cloro e agentes lacrimogéneos como o brometo de xilila. Este tipo de máscara não foi eficaz na filtragem dos gases fosgénio e difosgénio, mais mortais. Não havia máscara que pudesse oferecer proteção contra o gás mostarda que ataca todo o corpo exposto.
Como a máscara foi projetada para oferecer proteção contra produtos químicos específicos, o uso de um novo produto químico constituía um novo problema de proteção. Sempre que um dos contendores usava um novo produto químico no campo de batalha, os outros tinham que produzir novos filtros com diferentes agentes para neutralizar o novo veneno e, por vezes, isso demorava vários meses.
Além de filtrar o gás venenoso, a máscara de gás também precisava ser confortável e permitir visão total e respiração fácil. Também tinha de ser durável e permitir que os soldados conseguissem comunicar uns com os outros. Não é fácil combater, ou simplesmente deslocar-se, com os modernos equipamentos de proteção química. Há cento e poucos anos, estes equipamentos muito rudimentares dificultavam a visão e a respiração do soldado tornando a sua atividade muito mais penosa.
Sobre a evolução das máscaras antigás, ver Gas mask - Wikipedia.
A utilização do gás e os acordos internacionais em vigor
A utilização do gás já tinha sido condenada antes da Primeira Guerra Mundial, mas quando os exércitos de ambos os lados viram que as soluções convencionais não eram adequadas para romperem as linhas defensivas do adversário, recorreram a medidas extremas, mesmo que, com esse ato, estivessem a violar acordos internacionais.
No dia 24 de agosto de 1898, o Czar Nicolau II e o seu Governo apresentaram uma proposta para a realização de uma conferência sobre a paz. Sob influência de Jean Bloch, autor de A Guerra Futura e as suas Consequências Económicas (1898), o édito imperial para a conferência de paz defendia a necessidade do desarmamento:
«As crises económicas, devidas na maioria ao sistema de armamentos à l'outrance, e o perigo permanente presente na massificação de material de guerra, transformam a paz armada dos nossos dias num fardo esmagador, que as pessoas têm cada vez mais dificuldade em suportar. Parece evidente, então, que se este estado de coisas se prolongar, conduzirá inevitavelmente a um grave cataclismo que se deseja evitar, e os horrores que fazem estremecer de antemão todo o homem que pensa.» [ROBERTS, Adam, «Land Warfare: From Hague to Nuremberg» in HOWARD & ANDREOPOULOS & SHULMAN, The Laws of War]
Foi, portanto, com receio da corrida aos armamentos e da guerra total que a Conferência foi convocada, para ser realizada em Haia, nos Países Baixos. Começou a 18 de maio de 1899 e terminou no dia 29 de julho. No final, foram aprovados vários documentos relativos à conduta durante os conflitos armados, nomeadamente:
- Convenção para a Solução Pacífica de Controvérsias Internacionais;
- Convenção sobre as leis e costumes da guerra terrestre;
- Convenção para a adaptação à guerra marítima dos princípios da Convenção de Genebra de 22 de agosto de 1864;
- Declaração sobre a Proibição de Descarga de Projéteis e Explosivos de Balões ou por Outros Novos Métodos Análogos;
- Declaração relativa à proibição do uso de projéteis com o único objetivo de espalhar gases venenosos asfixiantes;
- Declaração relativa à proibição do uso de projéteis que podem facilmente se expandir ou mudar de forma dentro do corpo humano, como projéteis com uma cobertura dura que não cobre completamente o núcleo, ou contendo entalhes.
Os tratados, declarações e ato final da conferência foram assinados em 29 de julho daquele ano e entraram em vigor em 4 de setembro de 1900. Estes documentos foram assinados por vinte e oito potências, entre elas todas as Grandes Potências. Para o tema que estamos a tratar interessa-nos a Declaração relativa à proibição do uso de projéteis com o único objetivo de espalhar gases venenosos asfixiantes:
«As Potências Contratantes obrigam-se a abster-se do emprego de projéteis que tenham por objeto a difusão de gases asfixiantes ou deletérios.
A presente Declaração só obriga as Potências Contratantes em caso de guerra entre duas ou mais delas.
Deixará de ser vinculante a partir do momento em que, numa guerra entre as Potências Contratantes, uma das Potências beligerantes se juntar a uma Potência não Contratante.
[...]
Feita em Haia, em 29 de julho de 1899, numa única via, que será mantida nos arquivos do Governo dos Países Baixos, e cópias das quais, devidamente certificadas, serão enviadas por via diplomática às Potências Contratantes.»
Além destas disposições, a "Convenção sobre as leis e costumes da guerra terrestre" estabelece o seguinte:
«Artigo 22
O direito dos beligerantes de adotar meios de ferir o inimigo não é ilimitado.
Artigo 23
Além das proibições previstas em convenções especiais, é especialmente proibido: Empregar veneno ou armas envenenadas;»
Foram criadas expectativas sobre os objetivos da Conferência de Paz. Esperava-se que fosse uma conferência para o desarmamento e foi dessa forma que os órgãos oficiais e a comunicação social a referiu frequentemente. O seu resultado, como vemos pelas convenções e declarações aprovadas, não tinha a ver com desarmamento, mas sobre os limites da sua aplicação. Nesse sentido, a conferência foi entendida pela comunicação social e pelo público como um completo fracasso. No entanto, a "Convenção sobre as leis e costumes da guerra terrestre", embora adotasse muitas medidas mencionadas em textos anteriores, foi a primeira codificação das leis da guerra terrestre na forma de tratado multilateral. Outras novidades, foram a participação da sociedade civil através dos movimentos pacifistas, o carácter aberto das sessões, tendo a imprensa dado grande relevo às sessões e a aplicação do princípio igualitário de um voto por cada delegação.
Em 1907, realizou-se a Segunda Conferência de Haia, que começou em 15 de julho de 1907 e encerrou em 19 de outubro desse ano, contando com a presença de 256 delegados, representando 44 Estados. Na segunda Conferência, a questão da limitação dos armamentos não figurou como ponto da agenda devido, entre outras razões, à recente derrota russa no conflito com o Japão. A Alemanha manteve a sua oposição à inclusão de qualquer referência à limitação dos armamentos, tal como já sucedera em 1899, posição que era apoiada pelo Império Austro-Húngaro, Japão e Itália. O Reino Unido modificou a sua posição face a 1899, desejando agora a inclusão desse tópico na agenda, sendo apoiado pelos EUA e Espanha. A maior novidade, porém, foi a participação, sob proposta dos EUA, dos Estados da América Latina, o que significou a ampliação do número de Estados que se comprometiam com as convenções e demais instituições internacionais.
Foram aprovadas treze Convenções e uma Declaração. A "Convenção respeitante às Leis e Costumes da Guerra em Terra" estipulava, entre outras medidas, que as decisões adotadas na Conferência de 1899 se mantinham em vigor. Previa-se a realização de uma terceira Conferência de Paz, em 1915, mas a Primeira Guerra Mundial impediu a sua realização.
SEGUNDA OFENSIVA DE ARTOIS
O General Joffre tinha decidido lançar um ataque na região de Artois, no início de março. Foi solicitado ao comandante do BEF, General John French, que as forças britânicas lançassem um ataque sobre La Bassée. Também foi previsto substituir as forças francesas - IV Corpo de Exército - que se encontravam na área de Ypres, por unidades britânicas. No entanto, os reforços esperados pelo BEF estavam atrasados porque os britânicos estavam a preparar forças para a Campanha de Gallipoli. Não podendo contra com o IV CE, o General Joffre decidiu adiar a ofensiva que só teve início no início de maio, quando ainda decorriam os combates relativos à Segunda Batalha de Ypres (22 abril – 25 maio). Os britânicos lançaram uma ofensiva em Neuve Chapelle (10 – 13 março).
A ofensiva planeada pelo General Joffre contou com o apoio britânico. O seu objetivo tático era tomar a linha de alturas em Vimy Ridge. O plano era um ataque principal entre Carency e Roclincourt, apoiado por um ataque de flanco ao norte, com o objetivo imediato de capturar as alturas de Notre Dame de Lorette, avançando então para a planície de Douai, e um ataque de flanco ao sul visando a linha de alturas a leste de Arras. O ataque britânico a Aubers Ridge ocorreria no dia seguinte ao ataque principal. Uma segunda fase, uma vez capturada a linha de alturas de Aubers Ridge, a ofensiva continuaria na direção do Canal Haute Deule, a cerca de 8 Km de distância. Nenhum objetivo definido foi fixado para o dia do ataque, mas as unidades foram encorajadas a prosseguir o máximo possível. Ajustamentos feitos no plano, principalmente devido às condições meteorológicas, adiaram a ofensiva e fizeram com que o ataque britânico fosse lançado na mesma data que o ataque principal francês. As forças francesas e britânicas atacaram no dia 9 de maio.
Os franceses iniciaram as operações com uma preparação de artilharia que durou seis dias, executada por 1.200 bocas de fogo e em que foram consumidas cerca de 200.000 munições, um número elevado em 1915. A preparação de artilharia britânica, embora intensa, durou apenas 40 minutos. A escassez de munições, que tinha sido um problema desde o início da guerra, era, nesta fase, particularmente aguda. O Primeiro Exército dispunha de 504 bocas de fogo de artilharia de campanha e 121 de artilharia pesada. Dispunha de poucas munições e muitas das suas armas acusavam o "cansaço" de muito uso. Foi planeado o avanço de parte da artilharia assim que a infantaria conquistasse as primeiras posições. O general Haig tinha pedido um reforço da artilharia, mas ainda decorriam os combates da Segunda Batalha de Ypres e, por isso, o Segundo Exército britânico não pôde ceder parte das suas bocas de fogo.
A 9 de maio, o Décimo Exército francês, sob comando do General Victor Louis Lucien d'Urbal avançou numa frente de 10 Km entre Arras e Lens. Ao centro, o corpo de exército sob comando do General Pétain avançou mais de 5 Km nos primeiros noventa minutos e aproximou-se de Vimy Ridge. No resto da frente, os ataques franceses foram repelidos. Os alemães contra-atacaram ao centro e recuperaram muito do terreno perdido.
Os britânicos, por seu lado, lançaram um ataque sobre Aubers Ridge. O comandante do Primeiro Exército britânico, general Douglas Haig, tinha pedido artilharia extra para aumentar a eficácia do bombardeamento de (apenas) quarenta minutos planeado para a manhã de 9 de maio, mas as reservas foram encaminhadas para as forças ainda empenhadas na Segunda Batalha de Ypres. O ataque britânico foi um fracasso total. A intenção era atacar a norte e a sul de Neuve Chapelle e unir as duas forças de ataque para lá das defesas alemãs, mas, após a Batalha de Neuve Chapelle (10 a 13 de março), os alemães reforçaram as suas posições a norte daquela vila. Por outro lado, o bombardeamento britânico não foi suficiente para destruir as defesas alemãs.
As tropas britânicas foram batidas pelas metralhadoras alemãs e sofreram elevadas baixas. Muitos sobreviventes foram aprisionados na "terra de ninguém". Nenhum progresso significativo foi feito e, no início do dia seguinte, o General Haig deu por terminada a ofensiva. Numa frente estreita e num dia de luta, os britânicos sofreram 11.000 baixas. A próxima ofensiva britânica no âmbito da Segunda Batalha de Artois seria executada na Batalha de Festubert.
Após uma preparação de artilharia de 60 horas, durante as quais se gastaram 100.000 granadas disparadas por 433 bocas de fogo, a infantaria britânica lançou o ataque às 23H30 do dia 15 de maio. Este seria o primeiro ataque noturno na Primeira Guerra Mundial. Novamente as defesas alemãs não foram suficientemente danificadas e os progressos britânicos até ao dia 18 foram muito limitados e à custa de pesadas baixas. Os atacantes instalaram-se no terreno por forma a defenderem as posições conquistadas e, de 20 a 25 de maio, retomaram os ataques, com poucos progressos, embora tenham ocupado Festubert.
A ofensiva britânica resultou num avanço de 1.200 m, à custa de 16.684 baixas. Os alemães sofreram cerca de 5.000 baixas que incluíam 800 prisioneiros. Mais a sul, os franceses perderam 102.533 homens e os alemães 73.072.
Sobre a Segunda ofensiva de Artois, ver as páginas abaixo indicadas onde se podem encontrar também numerosoa mapas e fotografias.:
- «Second Battle of Artois» in Second Battle of Artois - Wikipedia
- Second Battle Of Artois: Most Up-to-Date Encyclopedia, News & Reviews (academic-accelerator.com)
- Webmatters : The 2nd Battle of Artois, 9th May 1915
- The Second Battle of Artois - It Led To A Scandal That Changed The British Government (warhistoryonline.com)
- BATTLES IN THE ARTOIS, WESTERN FRONT, WWI - FOOTSTEPS OF GENERALS — IN THE FOOTSTEPS OF GENERALS
- BAKER, Chris, «The Battle of Aubers» in The Battle of Aubers - The Long, Long Trail (longlongtrail.co.uk)
- BAKER, Chris, «The Battle of Festubert» in The Battle of Festubert - The Long, Long Trail (longlongtrail.co.uk)
O Escândalo das Munições
A Primeira Guerra Mundial colocou no campo de batalha o poder da indústria. No caso da artilharia, isto significou que as bocas de fogo disponíveis disparavam mais tiros por minuto do que sucedia algumas décadas atrás. As táticas utilizadas exigiam um consumo maior de munições. No entanto, todos os exércitos sentiam a escassez de munições. Os consumos verificados na Primeira Guerra Mundial surpreenderam todos os intervenientes, isto é, os próprios militares, os políticos e todo o sistema de produção de munições. A artilharia gastava mais munições do que a indústria poderia produzir. Falkenhayn, mais tarde, afirmou que a falta de apenas um trem de munições naquele inverno [1914-1915] ameaçava deixar partes da frente sem defesa. Os franceses exigiam 50.000 granadas de 75 mm (Canon de 75 mm modèle 1897) diariamente, mas, em meados de novembro de 1914, só conseguiam produzir 11.000. Em janeiro de 1915, as bocas de fogo de artilharia de 18 libras (18-pounder Field Gun Mark 1, 1906) apenas podiam gastar quatro granadas por dia [SIMKINS & JUKES & HICKEY, pp. 50-51]. Estas restrições não eram compatíveis com as necessidades para destruir as defesas inimigas. No caso britânico, o tiro de artilharia feito antes do ataque da infantaria - a preparação de artilharia - consumia numa batalha (no seu início, portanto) muito mais munições do que em toda a Guerra dos Bóeres (outubro de 1899 a maio de 1902).
O problema residia no facto de a conversão da indústria, para uma produção adequada à situação que então se vivia, ser um processo demorado que só foi resolvido em 1916. Portanto, em 1915, apesar dos grandes consumos de munições quando comparados com os conflitos anteriores, a artilharia não pôde efetuar o tiro que os comandantes desejavam e, em certas situações, esta escassez de projéteis ditou o fracasso ou, pelo menos, limitou o cumprimento da missão. [STRACHAN, Shells Crisis in 1915] O arrastar desta situação sem que se vislumbrasse uma solução rápida, as queixas apresentadas pelos comandantes britânicos, acabaram por gerar uma crise política no Reino Unido.
Os consumos verificados nas primeiras batalhas permitiram antecipar o problema, mas não houve a correspondente ação para o resolver. Seis semanas após ter começado a guerra, a França assinalou o problema. Os britânicos e os alemães sentiram-no mais tarde, em novembro. À medida que os dias se tornavam mais curtos e as condições atmosféricas pioraram, os consumos baixariam. Em agosto, o principal problema que se previa obrigar a reduzir os consumos, não era a produção, mas o seu transporte. A Primeira Guerra Mundial tinha sido iniciada como uma guerra de manobra, de movimento. Neste caso, as baterias de artilharia (unidades com quatro ou seis bocas de fogo), que também se movimentavam para dar continuidade ao apoio de fogos das unidades de manobra, conseguiam transportar um número limitado de projéteis. O sistema logístico também não poderia fornecer a mesma quantidade de munições que lhe seria possível fazer numa situação estática, como a que aconteceu com o sistema de trincheiras que impediu a manobra.
O problema agravou-se, não só porque a produção da quantidade de munições necessárias ao novo tipo de guerra era insuficiente, mas também porque o tipo de munições que agora se exigia era diferente. A artilharia procurava fundamentalmente destruir a organização do terreno e os obstáculos criados nos sistemas defensivos: cortar o arame farpado, destruir trincheiras e pontos fortes da linha de defesa, destruir vias de comunicação, linhas telefónicas, etc. A artilharia já não era utilizada prioritariamente para bater as formações de combatentes que avançavam em campo aberto. Ora, a artilharia britânica estava dotada maioritariamente com projéteis antipessoal e o que mais falta fazia passou a ser a granada de alto explosivo.
A produção de munições, feita em geral nas fábricas do governo, era feita tendo especial atenção ao controlo da qualidade, não da quantidade. No início da guerra, foi necessário alargar esta produção à iniciativa privada, mas não existiam as respetivas máquinas e ferramentas nem a mão de obra qualificada para o efeito. Um dos fatores que contribuíram para a escassez dessa mão de obra foi o recrutamento para o exército. A Alemanha, impedida de se ligar aos seus territórios ultramarinos, tinham o problema da obtenção de matérias-primas. A quantidade passou a ser a grande preocupação na produção de granadas de artilharia, em detrimento da qualidade. O mau funcionamento das granadas começou a ser notado no campo de batalha.
Estes problemas atingiram todos os beligerantes. «Os generais racionalizaram os seus próprios fracassos dizendo que só poderiam quebrar a linha inimiga se tivessem armas e projéteis suficientes.» [STRACHAN, Shell Crisis in 1915] Não deixava de ser verdade já que perante os insucessos em romper as linhas inimigas, começava a ser utilizada uma nova forma de atacar o adversário, a "guerra de atrito" ou "guerra de desgaste", que adiante explicaremos. Este tipo de guerra exige um consumo elevado e contínuo de munições. Os militares britânicos conseguiram dar ênfase a este problema pressionando os políticos para resolverem a situação.
A Batalha de Aubers Ridge (9 de maio de 1915) foi um fracasso britânico, devido à falta de granadas de artilharia. Foi assim que a imprensa britânica deu início ao que ficou conhecido como Shells Crisis. O comandante do BEF, General Sir John French, tinha alertado para o facto não apenas nos seus relatórios, mas também numa entrevista que deu ao The Times a 27 de março. O governo britânico, liderado por Herbert Henry Asquith, garantiu que o exército tinha munições suficientes, segundo as informações que lhe foram transmitidas por Horatio Herbert Kitchener, Secretário de Estado da Guerra. Após o fracasso de Aubers Ridge, o correspondente de guerra do The Times, coronel Charles Repington, enviou um telegrama a seu jornal denunciando a falta de projéteis altamente explosivos. Sir John French, forneceu-lhe informações e enviou Brinsley Fitzgerald e Freddie Guest a Londres para mostrar esses mesmos documentos a Lloyd George e aos líderes conservadores Bonar Law e Arthur Balfour. O The Times, a 14 de maio de 1915, anunciava: «Necessidade de projéteis; ataques britânicos verificados; suprimento limitado da causa; uma lição da França». No entanto, devido à sua reputação, o público britânico hesitou em questionar Kitchener, levando ao subsequente declínio da circulação dos jornais, apesar do crescente consenso de que a ação política era inadequada.
Paralelamente a esta questão, houve desentendimentos entre o Almirante Fisher, First Sea Lord e Winston Churchill, First Lord of the Admiralty, acerca da Campanha de Dardanelos. Lord Fisher demitiu-se. David Lloyd George e o líder conservador Bonar Law reuniram-se com Asquith a 17 de maio de 1915. Foi formado um governo de coligação, no qual Lloyd George ficaria com o, então criado, Ministério das Munições. O Munitions of War Act 1915 foi um Ato (legislação) do Parlamento britânico, aprovado a 2 de julho de 1915, para maximizar a produção de munições. Em França e na Alemanha foram tomadas medidas idênticas.
- DUFFY, Michael, «The Shell Scandal, 1915» in First World War.com - Encyclopedia - The Shell Scandal, 1915.
- STRACHAN, Hew, «Shells Crisis of 1915» in 1914-1918-online. International Encyclopedia of the First World War, ed. by Ute Daniel, Peter Gatrell, Oliver Janz, Heather Jones, Jennifer Keene, Alan Kramer, and Bill Nasson, issued by Freie Universität Berlin, Berlin 2016-02-26 in Shells Crisis of 1915 | International Encyclopedia of the First World War (WW1) (1914-1918-online.net).
A OFENSIVA ALIADA DE OUTONO
A ofensiva aliada no outono foi direcionada para as regiões de Artois e de Champagne. Quando o General Erich von Falkenhayn substituiu Helmuth von Moltke nas funções de Chefe do Estado-Maior General alemão, a 14 de setembro de 1914, os alemães retiraram algumas unidades da Frente Ocidental para reforçar a Frente Leste. O dispositivo militar que se opunha a franceses e britânicos ficava assim enfraquecido e o General Joffre procurou explorar a vantagem numérica dos Aliados na Frente Ocidental. É neste sentido que foi planeada a ofensiva dos Aliados no outono. Foi planeado um ataque franco-britânico na região de Artois e um ataque francês na região de Champagne. Após vários adiamentos, a ofensiva começou a 25 de setembro de 1915.
A ofensiva em Artois, que ficou conhecida como Terceira Batalha de Artois, foi executada pelo Décimo Exército francês e pelo Primeiro Exército britânico. A parte da ofensiva em que este participou foi a Batalha de Loos, que veremos mais em pormenor. A estas forças aliadas opunha-se o Sexto Exército alemão. O objetivo do ataque era dominar a linha férrea que passava em Douai, através da qual os alemães abasteciam as suas tropas e, desta forma, obrigá-los a retirar. Franceses e britânicos, apesar de algum sucesso inicial, fracassaram em penetrar na segunda linha de defesa alemã. Os franceses chegaram a capturar Vimy Ridge, mas um contra-ataque alemão obrigou-os a retirar. A batalha continuou até 13 de outubro, mas as chuvas de outono e a exaustão das forças obrigou a pará-la.
A ofensiva na região de Champagne, a Segunda Batalha de Champagne, tinha como objetivo controlar a linha de caminho de ferro em Attigny e, dessa forma, obrigar os alemães a retirar. As defesas alemãs, tal como na região de Artois, estavam organizadas em duas linhas. O ataque francês teve início a 25 de setembro, às 09H15. A linha da frente alemã foi rompida em quatro locais a partir dos quais os franceses conseguiram ocupar toda a linha e capturaram 14.000 militares alemães. Contudo, o arame farpado da segunda linha de defesa estava intacto. Os alemães lançaram alguns contra-ataques que lhes permitiu recuperar algum terreno e deter a ofensiva. No dia 29 de setembro, Joffre suspendeu a ofensiva até serem reabastecidos de munições e ordenou a preparação defensiva do terreno conquistado. Até ao fim da ofensiva, a 6 de novembro, as forças francesas lançaram pequenos ataques às posições alemãs, no que foi designado por guerra de desgaste (attrition). As linhas francesas avançaram cerca de 4 Km à custa de pesadas baixas.
Ver também The-Western-Front-Vol1.pdf (chacr.org.uk), pp. 64-68. A página 65 contém um excelente mapa da Terceira Batalha de Artois.
A Batalha de Loos
A Batalha de Loos ocorreu entre os dias 25 de setembro e 14 de outubro de 1915 e fez parte da Terceira Batalha de Artois. Esta batalha foi o maior ataque realizado pelos britânicos em 1915. Foi a primeira vez que o exército britânico utilizou um gás venenoso e foi a primeira intervenção significativa do New Army (Novo Exército).
Esta ofensiva foi realizada no terreno a sul do Canal de La Bassée. Os generais John French e Douglas Haig consideraram o terreno pouco adequado para o ataque porque existiam ali montes de escória que impediam movimentos rápidos e torres das minas e fundições, controladas pelos alemães. Por outro lado, a escassez de munições punha em causa o sucesso da operação porque os alemães estavam a construir uma segunda linha de defesa. A discordância foi apresentada a Joseph Joffre, mas nos contactos com Londres, a questão chegou ao Secretário de Estado para a Guerra, Horatio Herbert Kitchener que, por sua vez impôs aquela escolha ao comandante do British Expeditionary Force (BEF).
O ataque britânico, foi realizado pelo Primeiro Exército, sob o comando do General Sir Douglas Haig. Este exército era formado por cinco corpos de exército (I, III, IV, XI e CE Indiano). O XI CE constituiu a reserva que ficou sob controle do comandante do BEF que recusou colocá-las sob o comando do General Douglas Haig e estabeleceu que só seriam empenhadas no segundo dia de ataque. A 25 de setembro, antes do início do ataque, o General John French deslocou-se para Lilliers com alguns elementos do seu estado-maior, para ficar mais perto da linha da frente, neste caso a quase 20 Km, medidos em linha reta. Este movimento dificultou mais as comunicações entre o comandante do BEF e os comandos subordinados porque não tinham telefones diretos que os ligassem.
A preparação de artilharia, que começou a 21 de setembro, foi insuficiente. O General Haig dispunha apenas de 533 bocas de fogo e mantinha-se a escassez de munições. Era insuficiente para bater uma frente com 10,2 Km e com duas linhas de defesa. A destruição das defesas alemãs exigia, acima de tudo, a utilização de granadas HE (Hight Explosive). Esta insuficiência da artilharia foi a causa de, em algumas zonas das linhas defensivas alemãs, as defesas se encontrarem praticamente intactas. O arame farpado mantinha-se como um obstáculo ao lançamento do assalto das linhas alemãs e as tropas que aí chegavam tornavam-se um alvo fácil das metralhadoras alemãs. Além da preparação de artilharia, unidades especializadas na construção de túneis, da Royal Engineers, foram usadas para escavar na terra de ninguém e colocar cargas explosivas sob os parapeitos das trincheiras alemãs, prontas a serem detonadas assim que oportuno.
Havendo poucas munições de artilharia, o Royal Flying Corps (RFC), antes da preparação da artilharia, fez voos de identificação de alvos para assegurar que não seriam desperdiçadas munições. Durante o ataque, o RFC também teve a missão de identificar alvos e de os transmitir à artilharia. Para este efeito, já utilizavam aparelhos de comunicação sem fios, muito modernos para a época. Desta forma ajudavam a artilharia britânica a atacar os alvos alemães, mas também executaram missões de bombardeamento. Os aviões lançaram bombas de 100 libras (45 Kg) sobre as tropas alemãs, comboios e linhas de caminho de ferro, depósitos ou outras instalações logísticas.
Às 05H50 do dia 25 de setembro, simultaneamente com o fogo da artilharia, 142 toneladas de gás de cloro, contidos em 5.500 cilindros metálicos, manejados por 1.400 homens, foram libertados numa frente de 4 a 5 Km. O transporte de cada cilindro, que pesava mais de 80 Kg, necessitava de três a quatro homens para o transportar a uma distância de dois quilómetros e, tudo isto feito durante a noite. Os responsáveis pela libertação do gás alertaram contra a sua utilização naquela altura porque o vento estava muito fraco, mas imprevisível. No entanto, foi mantida a ordem de libertação do gás, o que foi realizado às 05H50 de 25 de setembro. O que sucedeu foi que uma parte atingiu as linhas alemãs, mas muito ficou na terra de ninguém por falta de vento e, em alguns locais, foi empurrado de volta para as trincheiras britânicas. O resultado foi o de o gás cloro ter causado mais baixas entre as tropas britânicas do que entre os alemães. As máscaras então utilizadas eram muito rudimentares e o embaciamento das oculares, prejudicando a visão, e a dificuldade em respirar com a máscara fizeram com que muitos soldados a tivessem retirado. Os britânicos sofreram, devido ao gás que eles próprios lançaram, 2.639 baixas, entre eles 7 a 10 mortos e 55 foram gravemente atingidos.
O Primeiro Exército britânico atacou às 06H30. Em muitos lugares, a artilharia britânica não tinha cortado o arame farpado. Apesar disso, principalmente devido à sua superioridade numérica, os britânicos conseguiram entrar na primeira linha das defesas alemãs. Capturaram um importante reduto defensivo – o Reduto Hohenzollern – e a vila de Loos (Loos-en-Gohelle). Às 07H00, o General Haig um oficial do seu estado-maior, de carro, para solicitar a libertação das reservas, mas às 10H00, Haig ainda não tinha conhecimento de que as divisões de reserva estavam a deslocar-se para a frente. O General French visitou Haig das 11H00 às 11H30 e concordou que Haig poderia utilizar as reservas, mas, em vez de utilizar o telefone, dirigiu-se de carro para o quartel-general (QG) e a ordem para as reservas avançarem só foi dada às 12H10. Só às 13H20 é que Haig teve conhecimento de que as reservas estavam em movimento.
O terreno por onde as reservas tinham que se deslocar não dispunha de estradas suficientes. O terreno era desconhecido para aquelas unidades e estava cheio de obstáculos. As unidades de reserva foram divididas em colunas pelas poucas estradas disponíveis e executaram a marcha, em parte, durante a noite. Quando a batalha recomeçou, no dia seguinte, os alemães tinham reforçado e melhorado as posições defensivas que mantinham em seu poder. Os britânicos já não dispunham de mais gás e a artilharia continuava a ter dificuldades devido à escassez de projéteis. Quando as unidades de reserva atacaram – doze batalhões, cerca de 10.000 homens – sofreram cerca de 8.000 baixas. Os britânicos foram obrigados a retirar e, quando voltaram para as suas posições iniciais, os alemães decidiram suspender o fogo por forma a que os britânicos pudessem retirar os feridos do campo de batalha.
No dia 28, Haig informou o General Foch, comandante do Grupo de Exércitos francês na ala direita das forças britânicas, que o Primeiro Exército não estava em condições de participar em mais ataques. Durante os dias 25, 26 e 27, os britânicos sofreram mais de 20.000 baixas, em que se incluíam três major-generais. Estas baixas britânicas, numa frente estreita, em três dias de combate, sem terem obtido ganhos territoriais significativos, foram superiores, quase o dobro, das baixas sofridas pelos Aliados no conjunto de desembarques na Normandia em 1944.
A batalha continuou por mais três semanas. No dia 8 de outubro, os alemães lançaram um contra-ataque para recuperar terreno perdido e atacaram à volta de Loos, mas o nevoeiro não permitiu a utilização adequada da artilharia e, tanto britânicos como franceses tinham organizado bem a defesa do terreno conquistado. O ataque alemão foi repelido, mas atrasou os preparativos britânicos para uma nova ofensiva. Quando terminou a luta, a linha da frente britânica permanecia próxima da linha alcançada no primeiro dia. Entre 25 de setembro e 8 de outubro, os britânicos perderam mais de 40.000 homens e, entre estes, contavam-se cerca de 16.000 mortos e 25.000 feridos. Os alemães terão perdido cerca de 25.000 homens.
A confusão provocada pela má gestão das forças de reserva, considerada a causa do fracasso do ataque, mas também uma campanha desenvolvida nesse sentido pelo General Douglas Haig, provocaram mudanças no comando do BEF. Sir John French regressou à Grã-Bretanha e, no dia 19 de dezembro, Sir Douglas Haig assumiu o comando do Corpo Expedicionário Britânico.
Ver também as seguites páginas que contêm numerosas fotos e mapas:
- The-Western-Front-Vol1.pdf (chacr.org.uk), pp. 69-74.
- Battle of Loos - Wikipedia
- Battle of Loos | National Army Museum (nam.ac.uk)
- The Battle of Loos - The Long, Long Trail (longlongtrail.co.uk)
- Battle of Loos in World War I (thoughtco.com)First World War.com - Battles - The Battle of Loos, 1915
- British artillery used at the Battle of Loos 1915 | Statista
- Loos 1915 | Great War Photos
BIBLIOGRAFIA
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- BAKER, Chris, «The Long, Long Trail» in Welcome - The Long, Long Trail (longlongtrail.co.uk), visto em 2023-09-18.
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Torres Vedras, 25 de setembro de 2023
Manuel F. V. G. Mourão